sábado, 9 de agosto de 2014

Leonardo cita o Flamengo para comentar o futebol brasileiro.









Como jogador, entre muitas conquistas, Leonardo ganhou títulos mundiais, pela seleção brasileira e pelo São Paulo; Brasileiros, por Flamengo e São Paulo; e da Liga dos Campeões, pelo Milan. Após pendurar as chuteiras, virou braço direito do presidente do clube italiano, onde também foi treinador, além de ter dirigido, em seguida, o seu maior rival, o Inter de Milão. Até o meio do ano passado, era o principal executivo do Paris Saint-Germain. De passagem pelo Brasil, após assistir à Copa na Europa, Leonardo analisou a atual situação do futebol brasileiro. E, com razão, defendeu mudanças radicais, conclamando a união de todos os envolvidos no esporte:

— Bom Senso, Romário, clubes, CBF, todos precisam se unir e caminhar juntos para uma grande reformulação. A gente tem que mudar a visão do todo. O Brasil é a sétima economia mundial, o futebol é a nossa grande paixão, mas, apesar de todo esse potencial, o mundo corporativo, e o próprio futebol, ainda vê o esporte como organização social, sem fins lucrativos. Isso limita demais a entrada de qualquer investimento. A visão tem que ser comercial, com fins lucrativos. O sistema do futebol tem que ser outro.

O EXEMPLO ALEMÃO

“Na Alemanha, foram criados centros federais, trabalho a longo prazo. Existe uma parte do projeto que é comum a todos. Aqui, todos defendem somente seus interesses. É preciso um movimento comum, no qual as pessoas convirjam para alguma coisa, que beneficie a todos. A CBF (antes, CBD) tem 100 anos. Como pode ser atual, se funciona da mesma maneira há um século? O que falta nessa engrenagem? Um grupo de executivos que conheça gerenciamento e futebol, e acorde e vá dormir pensando no desenvolvimento dele. A CBF é muito mais organizadora e controladora do que promotora do campeonato. Não acredito que o Marin e o Del Nero não queiram uma coisa que seja melhor pra eles, para os clubes e para o futebol brasileiro. A Premier League é o maior exemplo de sucesso profissional. Claro que, pelas nossas particularidades, não dá para pura e simplesmente implanta-la aqui. Mas muita coisa pode servir de exemplo. Temos que gerar ideias e riquezas. Nossa estrutura é muito engessada. A hora de mudar é essa.”

FORA DO MERCADO

“Precisamos criar uma nova estrutura para entrar no mercado. Estamos fora dele. Trabalhando direito, temos condições de fazer um NBA. Quanto custa o Neymar pra ficar aqui? Para o tamanho do negócio que se pode gerar, não é nada. Se, ao menos, fizéssemos um campeonato local forte, não precisaríamos nem competir com a Europa. A NBA não compete com ninguém e é um sucesso no mundo todo. Porque é um produto de altíssima qualidade. O Campeonato Brasileiro não passa em lugar nenhum do mundo. Não dá pra ver nem pela internet. Porque é um produto que não é reconhecido no mercado. Os jogos são desinteressantes, jogam em 70 metros, a TV não consegue nem enquadrar. Parece que há um desânimo, um conformismo. É assim mesmo, é assim que eu vou fazer e viver! E ainda se chama Brasileirão. Esse nome não pode ser internacional, nenhum estrangeiro entende, nem consegue pronunciar direito. Não vende lá fora...”

A IMPORTÂNCIA DA BASE

“Se a gente não tem uma base boa, ferrou. É como uma equação, erra a primeira soma, errou tudo. Isso acaba influenciando em todo o processo de formação. O menino que entra no Flamengo (e na maioria dos outros clubes), hoje, logo está dizendo ‘me tira daqui’. Ele quer é jogar na Europa. Eu, no meu tempo, quando entrava na Gávea, me benzia. Aquilo pra mim era um templo. A base hoje em dia tenta revelar jogadores pra vender. Quais são as receitas de um clube de futebol? TV, marketing, estádio e jogador . Na Europa, venda de jogador só contribui com 10% da receita. Aqui é muito mais. E a preocupação passa a ser vender logo a garotada. E se você negocia o jogador muito cedo, ele ainda nem está de fato formado. E muito talento se perde nisso.”

NEYMAR

“Neymar falou que no Brasil se treina pouco. E ele só descobriu isso aos 22 anos! Será que ele não poderia ser melhor se tivesse descoberto isso aos 18? Se tivesse tido outras opiniões táticas, poderia ser um autêntico 10. Hoje ele é muito mais hábil, jogando com uma linha atrás. Ele tem tempo, ainda pode vir a se tornar um craque completo. Mas poderia já ser. Taticamente estamos muito atrasados. Thiago Silva aprendeu a ser zagueiro na Europa. Antes era um monstro só no físico. Virou o melhor do mundo lá fora. No Brasil a gente aprende a jogar bola, não a jogar o jogo.”

TÉCNICA X TÁTICA

“Craque de bola é uma coisa. Ter estratégia é outra. A Alemanha hoje em dia tem talento, mas tem também estratégia. Já a Itália ganhou em 2006 só na estratégia. Materazzi, imagina, foi o artilheiro do time! Mas isso também é jogo! Só que a gente acha feio. Só que agora está todo mundo muito mais organizado taticamente. E para você conseguir fazer prevalecer o nosso talento, tem que estar organizado, pelo menos como eles. A gente precisa ter a visão do todo e depois colocar o jogador de talento. Aí, sim, vem o Neymar. Ele tem que ser o algo mais, não a base do time.”

MOTIVAÇÃO

“Aquele negócio de ‘vamos lá, vamos lá’, não funciona com o europeu. Isso ele rebate na hora: ‘motivação, não me pede, não, que eu já tenho’! Ele quer conteúdo. Quer saber a função e o que fazer, como se comportar, dentro de campo. Na verdade, os europeus veem o Brasil como o país que resolve no talento. Nunca uma conquista nossa foi atribuída, lá fora, ao treinador. O técnico brasileiro é mais forte em colocar os bons jogadores para fazer o que eles querem e não para armar o time taticamente. E o jogador brasileiro não gosta de discutir tática. É até cultural. A velha história do ‘dá aqui que eu resolvo’. Se não for um gênio, como Pelé, Maradona, Zico, Romário, não resolve mais, não. Da minha época, o técnico que mais claro mostrava o que queria era o Telê. Ele não era tático. Mas aperfeiçoava a técnica ao máximo! E com a qualidade técnica conseguia superar até a tática. Era um perfeccionista. Naquela época, a técnica fazia a diferença. Mas hoje, com a escola europeia jogando o que está jogando, um time só técnico está morto.”

7 x 1

“Não quero criticar apenas um jogo. Mas todo mundo sabia que a Alemanha ia pressionar a nossa saída de bola desde o início. Estava escrito. Se fosse um treinador italiano, ia dizer pro David Luiz mandar a bola lá pra frente e todo mundo sair. Os caras são melhores que a gente. Não dava pra jogar normalmente. Não sou contra um técnico estrangeiro, mas não acho imprescindível. Mourinho e Guardiola, sim. Não porque são estrangeiros. Mas porque são os melhores.”

CLUBES/ INVESTIMENTOS

“Os clubes têm que tomar a iniciativa! Porque sem eles não tem campeonato, não tem seleção, não tem nada. Campeonato sem CBF tem, sem Federação tem, sem clube, não. Os grandes atores são os clubes. E eles não podem estar tão enfraquecidos. E não adianta só sanear a dívida. Senão mudar o sistema e gerar riqueza, não resolve. Vai dever de novo. Para o campeonato ser forte, os clubes têm que ser fortes. Sem isso, é impossível. Precisamos abrir as portas dos clubes para as riquezas existentes no Brasil ou mesmo para as estrangeiras: o Chelsea é de um russo, o Paris Saint Germain, do Qatar, o (Manchester) United, dos americanos, a Roma também. As riquezas italianas estão no Milan, na Inter, Juventus a Fiat. O Bayern tem por trás a Mercedes. E nós estamos fora do mercado! Tem que profissionalizar a visão! Se um louco milionário resolve botar toda a riqueza dele no Flamengo, não pode. E o futebol está nas mãos dos empresários... Ora, já estamos penhorados. O cara entra numa falha do sistema. Quando disse, numa entrevista, há algum tempo, que deveriam vender o Flamengo, era a esse tipo de investimento a que me referia. A gente precisa criar uma estrutura para alguém colocar dinheiro. Só que quem botar 200 milhões de euros vai querer o comando e lucro. E terá um grupo de gestores que vai cuidar do investimento. Assim funciona. Mas hoje em dia, nenhuma assembleia de clube aceitaria um investimento como esse. Por política, medo, insegurança. Ora, o Flamengo já está vendido (para os credores de sua divida). E todos os clubes estão mais ou menos na mesma situação. Se alguém fosse dono ia lutar mais pra não perder o próprio patrimônio. Tem que descobrir onde está esse dinheiro e botar no futebol. Faturamento de 300 milhões ainda é pouco para resolver os nossos problemas.”

Fonte: O Globo


SRN

Fonte: http://www.noticiasfla.com.br/2014/08/Leonardo-cita-Flamengo-comentar-futebol-brasileiro.html

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